terça-feira, 11 de janeiro de 2011

Responsabilidade política


Um dos grandes problemas da actualidade política prende-se com a capacidade com que os nossos políticos se desprendem das suas responsabilidades. O exemplo perfeito é ilustrado pela rotatividade no governo, que alterna pontualmente entre PS e PSD. Ora quando temos um governo PS, assistimos a críticas constantes do executivo sobre os problemas causados pelo executivo anterior que condicionam a actividade política presente. Depois chegam as Legislativas, o PSD derrota o PS e sobe ao poder cheio de promessas mas, com o tempo as promessas caem por terra porque afinal havia muita coisa escondida por baixo do tapete. Cria-se um ciclo vicioso, uma espiral de desresponsabilização berrante que para os menos informados “é normal” e, caso os menos informados sejam simpatizantes do partido que ascende à liderança, não só “é normal” como é a condição que perdoa o seu mau desempenho futuro. Depois assistimos a discussões em que os apoiantes do governo dizem que tudo é feito dentro do possível e só não se faz mais porque o governo anterior deixou um legado caótico, ao passo que os apoiantes da oposição dizem que a situação até podia ser má mas o actual executivo conseguiu piorá-la consideravelmente. Esta lógica de ataque/contra-ataque não só é contraproducente e retira foco do que é realmente importante, como invalida a capacidade de unir para solucionar. Mas o efeito mais perverso desta questão reside na tendência fatalista que tem vindo a crescer de mãos dadas com a jovem democracia portuguesa, uma tendência que aponta para uma certa inevitabilidade do rumo dos acontecimentos, plasmado num conformismo enraizado na mentalidade lusa. Esta tendência impede a emergência de uma sociedade civil forte e coesa, capaz de escrutinar devidamente o trabalho dos seus políticos, políticos esses que não são mais que representantes designados pelas massas para gerir os recursos comuns e optimizar o bem-estar de todos. Esta situação é a realidade do nosso país desde 1974.
Olhemos agora para o nosso ainda mais jovem concelho. A Trofa garantiu a sua independência face a Santo Tirso a 19 de Novembro de 1998, após uma autêntica marcha sobre a Assembleia da República, marcha essa que, para além do momento épico que a todos proporcionou, não levantou o seu cerco sem que chegasse a garantia da autonomia trofense. Seguiram-se dias de festa até que chegou a política. Na altura, o Partido Socialista opôs-se categoricamente à criação do novo concelho, ou não fosse Santo Tirso um bastião rosa. Assim, demagogicamente, foi entendido que os socialistas eram contra a criação do concelho. É claro que a estrutura partidária era contra a amputação de um concelho da sua cor, como teria acontecido caso se tratasse de outro partido qualquer. Esta realidade associada à tendência laranja que tem acompanhado a Trofa desde sempre criou um mito (muito bem explorado por alguns dirigentes sociais-democratas), de que os socialistas eram opositores da nossa liberdade. Permitam-me a ousadia de querer acreditar que, se houve momento em que socialistas, sociais-democratas, comunistas, centristas e todos os outros simpatizantes de outras forças políticas estiveram de mãos dadas foi nesse momento. Se calhar precisamos de uma luta comum todos os anos, uma luta em que nenhum aspecto esteja comprometido.
Voltando ao desenrolar dos acontecimentos políticos na Trofa pós-1998, foi criada uma Comissão Instaladora para gerir a transição do poder da esfera tirsense para a esfera trofense. Este órgão foi extinto quase 3 anos mais tarde quando a 16 de Dezembro de 2001 foram levadas a cabo as primeiras eleições para os órgãos autárquicos, eleições que colocaram Bernardino Vasconcelos na presidência do município, cargo que ocupou até Outubro de 2009. Durante o seu mandato, e apesar do esforço notório para dotar a Trofa de infra-estruturas básicas (saneamento, arruamentos, etc.), o executivo social-democrata em exercício esteve debaixo de fogo em várias situações, nomeadamente especulações sobre favorecimentos a elementos do partido materializados em avenças ou acesso a cargos públicos sem concurso. Hoje, um ano e três meses após a saída do antigo presidente, e com a chegada de Joana Lima, líder do executivo desde as últimas eleições, as mesmas acusações que foram feitas no passado ao PSD têm agora como alvo o executivo socialista. A história repete-se. Repete-se nestas acusações e noutros braços de ferro que desviam a atenção e a energia daquilo que é realmente importante. Fracturam a Trofa com alinhamentos de conveniência e fantasmas da pressão exercida por parte dos financiadores das campanhas dos vencedores. E mais grave que isto, a sociedade alinha-se por um dos lados sem perceber que apenas contribui para uma maior fracturação e não para a mobilização necessária para que o barco trofense chegue a bom porto. Pior: alinha-se por cor política, muitas vezes ignorando as soluções apresentadas pelos “beligerantes”. Precisamos de lutas comuns, falta-nos um pólo aglutinador. Mais que partidos políticos, a sociedade moderna precisa de movimentos de cidadania independentes que realmente se preocupem com os interesses das populações, blocos apartidários com contributos de cidadãos de diferentes sensibilidades com o objectivo comum de criar condições para melhorar o bem estar das populações, esclarecer de forma imparcial todas as dúvidas que flutuam na subversividade dos jogos políticos e, acima de tudo, valorizar o cidadão como parte da solução e não apenas como um dado estatístico.
Acredito que falo por este núcleo quando digo que não pretendemos impor verdades absolutas: em vez disso, pretendemos discutir temáticas e contribuir, no limite das nossas possibilidades, para esclarecer todos aqueles que pretenderem ser esclarecidos. Cidadãos esclarecidos são mais interventivos e, por conseguinte, mais assertivos na racionalização dos seus problemas. Queremos discutir o problema e fazer parte da solução. Assim se faz política.
Cumprimentos, 

Por




João Mendes

2 comentários:

  1. Maria Emília Cardoso11 de janeiro de 2011 às 16:23

    Um artigo muito bom.Uma análise muito realista sobre o que se passou no nosso concelho com a qual eu estou de acordo. Uma reflexão sobre a total impunidade dos políticos face ao incumprimento das promessas que fazem durante as campanhas eleitorais e que levam as pessoas a darem-lhe os seus votos. E o pior de tudo é que esses votantes nem ligam para esse aspeto.Falta de sentido crítico, défice de cidadania, partidarite aguda, seja o que for, não dignifica o nosso país, nem os portugueses.

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  2. Muito obrigado pelo seu comentário e pela análise positiva.

    A crítica ao défice de cidadania na sociedade portuguesa que refere, e que subscrevo na íntegra, é um dos maiores entraves ao desenvolvimento de uma massa crítica capaz de, com a sua participação, com o seu contributo, gerar sinergias para obter soluções. Os portugueses tem que se "auto-educar" para voltarem a ser um povo interventivo. Até lá continuaremos a ser uma sociedade civíl fraca.

    Cumprimentos

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